A condição de que empresa em recuperação judicial enuncie certidões negativas de débito para participar de licitação, desconsidera o interesse público na preservação da atividade econômica e dos empregos.
Com essa compreensão, a 1ª Vara de Falência e Recuperação Judiciais de São Paulo desobrigou a empresa Eit Engenharia, em recuperação judicial, de apresentar certidões negativas de débito para participação em licitação e contratação com o poder público. A decisão é de junho de 2020.
O juiz Tiago Henriques Papaterra Limongi estabeleceu que a limitação da participação de empresas em recuperação judicial em concorrências públicas desconsidera o interesse público na persistência da atividade da companhia e dos postos de trabalho.
De acordo com o juiz, a exigência das certidões negativas dificulta, ainda mais, a recuperação da empresa, objetando o instituto criado pela Lei de Falências (Lei 11.101/2005).
Segundo Limongi, o poder público não pode exigir apresentação de certidão negativa de recuperação judicial para empresa participar de licitações, pois o requisito do artigo 31, II, da Lei de Licitações (Lei 8.666/1993), fala em certidão negativa de falência ou concordata. No entanto, a figura da concordata foi extinta, e não é certo afirmar que a recuperação judicial a substituiu, apontou o julgador, ressaltando que a Lei de Falências autoriza a companhia em reabilitação a contratar com a administração pública.
Quanto à imposição da apresentação de certidão negativa fiscal, Limongi evidenciou que o Superior Tribunal de Justiça considera que recuperações judiciais podem ser concedidas mesmo sem o documento. Isso devido à realidade de endividamento fiscal das empresas em crise e da ausência de programa adequado para parcelamento de dívidas para companhias em reestruturação. Como não se pode requerer certidão negativa fiscal para recuperação judicial, também não é possível cobrar o documento para contratação com o poder público, avaliou.
Com relação à premissa de certidões negativas de débitos trabalhistas e FGTS, Tiago Limongi frisou que dívidas desse tipo não poderiam ser pagas, sob pena de a companhia violar a paridade com os outros credores.
Predileções Sociais
O advogado da empresa Roberto Keppler, sócio da banca Keppler Advogados, declarou que a decisão é importante por conceber uma discussão a respeito da prevalência dos interesses sociais sobre a legislação.
Segundo Keppler, é “anacrônico” proibir a participação de companhia em recuperação judicial em licitação pela falta de certidões negativas. A seu ver, isso “joga contra o desenvolvimento e retorno do ambiente empresarial”.