Em meio ao desequilíbrio causado pela COVID-19, cujas consequências vêm ultrapassando todos os limites da área pública e privada, grandes e pequenas empresas se mobilizam para suportar os efeitos da crise e se prevenir de uma exponencial instabilidade econômica.
Diante das diversas medidas tomadas pelos governantes para conter o vírus, como o cancelamento de eventos, fechamento de Shoppings e do comércio em geral, institutos muito antes utilizados e tidos como eficazes e econômicos, acabam sendo postos em cheque, dentre eles se encontra a terceirização de serviços.
Através da terceirização, se estabelece uma relação chamada B2B, ou business to business (empresa para empresa), o que promete flexibilidade e eficiência na prestação de serviços.
Por este meio, empresários visam diminuir os custos e flexibilizar os meios de trabalho de sua empresa. Porém, apesar dos diversos benefícios advindos da terceirização, em meio a uma crise mundial resultante das medidas tomadas para prevenção e combate ao SARS-CoV-2, os contratos de prestação de serviço anteriormente firmados em um cenário completamente diferente do atual, agora podem ser vistos como extremamente onerosos e ineficientes ao contratante.
O Código Civil Brasileiro dispõe acerca das possibilidades de rescisão deste tipo de contrato, ao se tornar excessivamente oneroso para uma das partes. O art. 478[1], dispõe sobre a possibilidade de um dos contratantes pugnar pela rescisão do instrumento, em virtude de onerosidade excessiva causada por acontecimentos extraordinários e imprevisíveis.
Importante ressaltar que a COVID-19 passou a ser considerada motivo de Calamidade Pública pelo Senado Federal, a partir do Projeto de Decreto Legislativo 88/2020[2]. O significado de “calamidade” é especificado pelo dicionário como “desastre, catástrofe”[3], podendo, portanto, ser considerado um acontecimento extraordinário e imprevisível ou, adequando melhor ao presente contexto, como caso fortuito ou força maior.
Ainda que não possamos prever como o assunto será tratado pelos tribunais do País, diante do exponencial crescimento de casos da doença e, consequentemente, das diversas medidas de afastamento social adotadas pelo governo, resultando no cancelamento de eventos, fechamento de Shoppings e empresas diversas, a pandemia nos parece caracterizar grave motivo de caso fortuito ou força maior para fins de rescisão de contratos.
Em análise à legislação civil brasileira, a possibilidade de rescisão do contrato por força maior se encontra descrita no Art. 607[4] do Código Civil, o qual dispõe sobre o fim do contrato de prestação de serviços em razão da impossibilidade de cumprimento deste, motivada por força maior.
Neste mesmo sentido, o Art. 393[5] estabelece que o devedor não responderá por prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, cujos efeitos não poderia evitar ou impedir, o que pode ser reconhecido neste cenário de crise mundial resultante da pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2, excluindo, portanto, a possibilidade de aplicação de multas decorrentes da rescisão antecipada do contrato.
Importante destacar que, antes que se possa discutir a possibilidade de rescisão de um contrato, sua análise por profissionais capacitados é sempre crucial, posto que há a possibilidade de que o instrumento assinado entre as partes, disponha de cláusulas que abram mão do direito de rescisão por motivos de força maior, caso em que o risco é inteiramente assumido pelas partes.
Ademais, é inquestionável que a legislação brasileira traz aos contratantes a possibilidade de se rescindir um contrato sem culpa, em razão de caso fortuito ou força maior. Contudo, caberá ao interessado avaliar a possibilidade através da análise do instrumento. Posteriormente, o contratado poderá buscar seu direito de rescisão, através de notificação formal endereçada à outra parte.\
Por fim, importante que se reconheça que as questões aqui discutidas são uma análise jurídica inicial dos fatos. Em virtude do cenário inédito e emergencial aqui exposto, negociações amigáveis para revisão ou rescisão dos contratos em referência, devem ser vistas como uma forma mais fácil e prioritária de se resolver esse tipo de conflito.
[1] 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato
[2] https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/141114
[3] https://www.dicio.com.br/calamidade/
[4] Art. 607 – O contrato de prestação de serviço acaba com a morte de qualquer das partes. Termina, ainda, pelo escoamento do prazo, pela conclusão da obra, pela rescisão do contrato mediante aviso prévio, por inadimplemento de qualquer das partes ou pela impossibilidade da continuação do contrato, motivada por força maior.
[5] Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.